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  • Foto do escritorPsicólogo Renato Orlandi

Passeando rapidamente sobre a história da loucura

Platão, no Banquete, diz que o médico é aquele que está atento ao pathos (paixão, excesso, passagem, passividade, sofrimento, assujeitamento), pois as doenças se apresentam como um excesso de paixões, assim, o terapeuta é aquele que exerce o cuidado sobre o Eros ferido. O acometido pela paixão, o paciente, o portador de sofrimento psíquico, é aquele que padece de algo cuja origem ele desconhece e que o leva a reagir, na maioria das vezes, de forma imprevista. As paixões atestam nossa permanente dependência do Outro.

Na Grécia pré-socrática, o sofrimento psíquico era um castigo dos deuses irritados com a hybris dos homens, o desafio, o crime do excesso e do ultraje, confiança excessiva, orgulho exagerado, presunção, arrogância ou insolência, quando o homem tenta ser um deus. Com Galeno, a loucura passou a ser entendida como um efeito do desarranjo na natureza orgânica do homem, uma disfunção humoral (dos líquidos ou fluídos, sendo eles sangue, bile negra, bile amarela e fleuma), afastando sua influência divina.

A visão medieval da loucura está intimamente associada à possessão demoníaca, o louco saiu do lugar de pessoa privilegiada por ouvir ou deuses e ter uma sabedoria sobrenatural da vida para ser aquele que era influenciado por demônios. Uma grande ruptura veio com Freud a partir da dimensão do desejo que é submetido a linguagem. Ele postulou que o sujeito sempre fala, fala do, e a partir de seu pathos, e a trama encarnada pelo Outro (transferência) se transforma em percepção e experiência, é a cura pela fala.

Depois disto, a partir do século XVII iniciaram as tentativas de estabelecer critérios da fisiologia nervosa até o século XIX da biologia molecular dos distúrbios, da psicofarmacologia e das neurociências, retirando o caráter social e da subjetividade humana. Você viu quantas formas de explicar a loucura? Seguimos hoje com as explicações biológicas da medicina e das neurociências e filosóficas da psicologia.

E o futuro da loucura? Bom, cada vez mais estamos percebendo de forma integral os fatores predisponentes e determinantes das afecções mentais e emocionais para atuar sobre elas, apesar do avanço da tecnologia médica e diagnóstica, estamos descobrindo que o trabalho adoece, que a organização social e econômica adoece, que a pobreza também adoece, os fatores sociais, de moradia, acesso a lazer, educação e cultura são fatores que contribuem para o bem-estar geral e qualidade de vida emocional. 

Isto quer dizer que a saúde mental vai muito além do que uma diferença individual, mas depende da coletividade, da integração social e descobrimos que todos nós temos, em alguma medida, alguma alteração ou necessidade de cuidado e que as nossas relações com o mundo e com as outras pessoas podem ser essenciais para conseguirmos viver bem com as nossas diferenças e as diferenças do outro.

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