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  • Foto do escritorPsicólogo Renato Orlandi

O céu rápido

“Todo mundo quer ir para o céu, mas ninguém quer morrer”, diz o provérbio. E parece que cada vez mais recorremos a esta fantasia infantil de buscar o céu rápido. Será que tem um céu rápido? Céu de bolso, um minimercado de condomínio, apenas para emergências, onde os anjos são diminutos e deus é o ego, controlamos todos os seus movimentos. 

Não. O ego não é deus, para conhecer Deus, o Self, a Essência, a Fonte, o Uno, o Tao, Beyonce, seja lá como você chama é preciso passar pelo inferno. Mas optamos pelo prazer imediato, ninguém tem mais tempo de esperar a árvore crescer, árvore? Eu nem estarei vivo para ver isto, plantar a semente? Não. Queremos a fruta metafísica mais doce que existir das árvores do conhecimento e da vida do Éden, e para já, agora na minha mesa, mesmo que seja a versão artificial, plástica e simulada, queremos as respostas mais curtas e diretas, o segredo da vida em 140 caracteres para ler no elevador, uma palavra que resolve tudo, manda para direção correta e depois mais e mais e mais, não tem fim. 

Queremos intermináveis influxos hormonais de prazer e orgasmo eterno, quer seja pelas drogas, sexo ou mesmo os dogmas. O problema é que qualquer mito que se pesquisar conterá o oposto disto. Jesus precisou morrer para ir para o céu, o herói precisa ser engolido pela baleia para se transformar na escuridão, o chumbo precisa passar pelo fogo para se tornar ouro, o monge precisa abrir mão do desejo para alcançar a iluminação, Dante precisou descer até o último círculo do inferno para sair dele… Jung escreveu que ninguém se torna mais iluminado por imaginar figuras de luz, isso mesmo, adeus lei da atração, o segredo é ter a coragem necessária para olhar para a própria sombra e encontrar ali o tesouro, morrer no sentido de se transformar para depois alcançar algum céu. 

A pessoa que chega em algum lugar precisa necessariamente ser diferente daquela que iniciou a jornada, nenhum de nós aqui e agora vai para o céu como estamos hoje, a grande questão é: será que você está no caminho difícil ou paralisado pelos atalhos da modernidade?

Sobre a neurose de não seguir o caminho da alma ou as “falsas metas e ídolos dourados que correspondem ao sonho ocidental de sucesso” Jung diz: “já vi amiúde as pessoas ficarem neuróticas quando se contentam com respostas erradas ou inadequadas às perguntas da vida. Procuram posição social, casamento, reputação, sucesso material ou dinheiro e permanecem infelizes e neuróticas ainda quando alcançam o que estavam buscando. Estas pessoas estão, em geral, confinadas dentro de um horizonte espiritual muitíssimo estreito. Sua vida não possui conteúdo ou significado bastante”. 

James Hollis diz que “os homens pararam de realizar as perguntas corretas e, portanto, sofrem doenças até morrer” e questiona “por que outro motivo estamos aqui, sobre este planeta que gira, senão para tentar conhecer a nós mesmos?”. Ele diz que os homens usam seu trabalho para se afirmar, mas não se sentem com valor ainda quando alcançam sucesso e que não é possível fazer isto ser ter realizado o trabalho da individuação. Ele cita Albert Camus: “sem trabalho, a vida se decompõe. Mas quando o trabalho é inexpressivo, a vida estiola e finda”.

A salvação para o homem está na necessidade de retornar a jornada da alma, de compreender que somos nossa “jornada” e não nossas “feridas”, assim, Jung aponta a questão fundamental que devemos fazer a nós mesmos: “isto está ou não relacionado com algo infinito?”. E o infinito não está nem um pouco interessado para o modelo do seu carro novo, seu cargo na empresa, seus títulos, o bairro que você mora ou a marca da sua roupa.

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